quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Destruindo desastres

Desastres destroem a poesia! Ou, na verdade, o fenômeno assume proporções inversas: A cada fatalidade que acontece a força poética retorna com mais viço, mais cheia de vida, basicamente porque a razão de ela existir é o fato de estar viva, e esse é um motivo mais que satisfatório para a celebração. Quando não, a própria emissão do sofrimento em palavras proferidas por sopros sofridos pode ser um remédio natural, tão natural quanto possa ser algo emitido de um corpo cheio de metamorfoses com substâncias sintéticas e sintáticas do mundo exterior. O alimento é da fábrica. O lápis Faber é manuseado por uma mão que se engana, titubeia, erra, corre, se desprende, organismo dissociado, esboçando vitalidade ímpar, como a famosa mão de parente pertencente à tenebrosa família. Famílias na lama vêem o sol secar o barro e as figuras que surgem dessa interação não são arte. Malabarismos para resgatar o que sobrou. O que sobra é resto. O que resta do vocabulário são grunhidos de insatisfação, que nem quem bebe pinga e geme de dor - ou prazer -, se auto-penitenciando - ou em ritual sadomasoquista. O futebol atual ganha ares de arte, de espetáculo, e com isso perde sua naturalidade. As casas dos dirigentes começam a cair e aos poucos vão sendo encaminhados formalmente às penitenciárias, subindo por um túnel rumo a campo desgramado. Pagar dez milhões para responder em liberdade é virar o tapetão e retirar toda a sujeira debaixo para manter-se por cima. Dinheiro sujo. Cinquenta milhões de dólares pela lama que rolou em Minas: É pouco! A natureza perdeu toda a sua naturalidade. E todos que perdem procuram poesia. No jogo e na vida há perdas e ganhos, mas tomar de lavada, de goleada, é receber surra sem conotação prazerosa. É desastroso! Não é mesmo, Brasil? Não é mesmo, São Paulo, coração do Brasil? “Não sou conduzido...”. Tiros de misericórdia são o fim de desastres. Balas atiradas em guerras são só o começo. Sucedem aos quatro ventos, nos quatro cantos do mundo. Rezar por todos ou por nenhum. Na fé religiosa mais fervorosa - e perigosa - quem mais sofre merece o reino do justo paraíso (com virgens ou devassas). O mesmo se dá com a poesia: nutrição por “sofrência”. A diferença crucial e principal é que a segunda pertence ao reino dos homens, do mundano, do humano, e por isso é mais necessária. Trevo de quatro folhas. Sorte. Preparo para as batalhas. Free-Style. Não sou poeta. Ou todos são. E que a poesia destrua os desastres.