sábado, 29 de outubro de 2016

Abóboras no bananal

Não me lembro de um primeiro outubro. Lembro-me do vermelho (o filme), e do rosa (a causa). Ainda nele, por agora. Não lembrar é lapso de memória relapsa que seleciona fatos ao bel prazer, ou, não conta até dez antes de rodar a roleta do que fora guardado, contando apenas até o mês nove, e no fim a bala nunca alcança o destino no tiro ao alvo do mês posterior (dez), saindo pela culatra. As placas levantadas pelos seres invisíveis que julgam atingem apenas a média, sete, dando respaldo para a continuidade da disputa ferrenha dos dias. Desmembrar de vilipêndios. A pergunta no canto do espelho cantada em fado: “Trinta e trei e o que cê fei, véi? Ficou mais sábio?”, e a reposta sai em eco que embaça o vidro: “Nada... Não sei nem assobiar...”. Não, não é conto de fadas. Reafirmada a afirmação da realidade. Trinta e três. Cristos crucificados não se salvariam. Demais até para Dimas. 33. E o menino morreu enforcado com 13. Menos 20. Sim, sei fazer contas simples, mas mesmo assim às vezes as contas não batem. Para alguns, bater carteira pode ser a única opção. “Credo cruz! Valha-nos nosso senhor Jesus. Que tenha aqueles que morrem jovenzinhos...”. Não chegou à melhor-idade, o filho do Pai — e o moleque, como muitos pelas ruas —, talvez porque alcançara o seu ápice, e após, todo o resto seria declínio. Sabia de antemão, então foi ser o braço direito do criador de todos no céu fabuloso. Fábula se difere de mitologia. Os mitos de hoje em dia deixam muito a desejar se comparados aos de outrora. Outro ponto de vista, vistas dos pontos, Casuarina. Como se pergunta alguém em Star Trek Beyond quando começa a tocar rock'n roll para interferir na frequência das naves que se agrupam como enxame: “Estão tocando música clássica?”. Num possível futuro em uma das linhas bifurcadas do multiverso o rock será clássico. Enquanto isso abóboras são usadas de enfeite na América de lá. Aqui fazemos gastronomia. Valorizamos as caçarolas de nossos antepassados de peles vermelhas, marrons. Comemos até o talo. Sem desperdício. “Será?”. Houve na USP, em São Paulo, uma mostra de cinema indígena com filmes produzidos pelos nativos de cá. Todos têm capacidade de lidar com o novo, mas é preciso preservar as tradições. Se me disserem que “é a crise”, que “a bruxa está solta” taco fogo no meu cabelo e saio correndo pro outro lado com meus pés ao contrário. Monto na primeira mula sem cabeça que topar. O afro-tupiniquim do linguajar assimilado e incorporado na normativa do português-brasileiro é um tapa na cara da high society. Como cantou Duck Jam e a Nação Hip-Hop: “Burguesia, nobreza, elite, alta-classe, são assim que são chamados, não é verdade?”. Sociedade que ainda insiste em não liberar um tapinha 4:20 ou em qualquer outro horário. Sistema carcerário precário que prende em sua maioria afro-tupiniquins. Muitos homens brancos não têm mais o branco dos olhos branco. Enquanto isso, o sorriso amarelo dos bancários vai se embranquecendo com o lucro que obtêm. Bem. João Antônio deu mostras da honestidade do jogo do bicho em Ô, Copacabana! Uma instituição genuinamente brasileira que por mais que esteja na alcunha da clandestinidade, da contravenção, tem idoneidade perante seus pares. É a identificação mútua de quem vê seu semelhante do outro lado da rua (ou do outro lado da tela) e se identifica, cumprimenta, saúda, amigavelmente. Não é uma calçada de Copacabana cheia de gringos vindos para o fim do ano exibindo a sua vermelhidão de pele tostada, sua linguagem quadrada, sem graça, gostando da graça das meninas daqui, fazendo turismo... Com elas. Nem todos. Nem todas. Nada é absoluto. Abóbora é todo aquele que fica com cara de tacho diante de qualquer despacho. Oferendas a Nanã, e que ela não recuse. “Doce ou travessura?”. As fãs dirão que a voz do Rodriguinho (ex-Travessos) é doce... Melhor é doce de banana retirada diretamente do bananal, mais doce do que o doce de batata doce. Antes fosse... E me rendo. Até novembro...