sábado, 27 de dezembro de 2014

Um pouco de tudo e tudo de nada

Um filme sem continuação. Preserva-se o gosto de quero mais pela eternidade. E que gosto tem o gosto de quero mais? Gosto de quero mais! Quem gostou assiste de novo, na memória. Quem não, deleta do HD, busca novas películas para emoldurar a pele, os ossos, o raio que parta essa fita, esse disco, coloque no raio duma bicicleta para apagar tudo que foi gravado. Raspa. Risca. Estar em cena é risco. Arrisca não seguir à risca a marcação pra ver só no que vai dar... Perde o foco de atuação. Frases improvisadas. Risadas de medo, choros alegretes, chorinhos, chorões, fazendo trilha para a mountain bike da vida do triatleta sedentário que de coringa virou carta fora, vinte duas vezes estourado no vinte um, até trinta e três, quem sabe? Nada sabe quem segura a caveira na mão e pira, ou pensa que fazer pose de pensador é pensar. E a porra da câmera filmando na rua; o segurança do banco seguindo com o tripé a sequência do transeunte que só exerce o seu papel, atrás daquele paquete que poderia ser de papelão; e outros querendo retirar seu equilíbrio de três pés. Andar é dois. Raso. Viver é três. Um em pé. Colocar a cabeça pra fora d’água é apenas respirar. Quatro é equilíbrio para medir até que ponto foi o efeito da manguaça. Num tropeço na piscina. Chave de condução que foi pro ralo, depois de um ano de ralação. Pronto pro próximo ponto. De ônibus. Final. Tem os que são circulares. Rodam como barata tonta. Não têm epifanias de Kafka. Só comem. E como! Asa de qualquer coisa frita em um domingo à tarde. Sentar num formigueiro para a digestão acelerada. Quem acelera é o motô, achando que lida com boi, e é só saco que bate no banco quando chega a lombada, acabando com o futuro de futuros motôs e outros que baterão o saco no banco. Féla! Nenéns não farão mais “Kuti, Kuti”. Cuspindo veneno de cobra no catarro. Sem barro pra moldar ghost. “Gosthamuitho” ainda é pouco. E se o pouco com ele era pouco mesmo, pra que ficar se poupando? Voar pelo vidro na batida e bater no poste em cabeçada pode fazer uma luz acender. Em vida envidraçada. O vermelho brilha na luminosidade obscura. A vida dura dura. Bastante. E mesmo morando no sul chegará a comprovar que rapadura é doce, mas não é mole.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Tudo e nada

A justa medida entre tudo e nada. Difícil. Quando não se tem nada, dá-se a cara à tapa sem pestanejar. Quando se tem tudo, uma pedrada ganha o peso de uma pancada com lajota. O nada leva a buscar o tudo com todas as forças possíveis, imagináveis e até outras ocultas. O tudo estagna. Cinco dedos são ambíguos. São tudo e são nada. Uma mão comum. Igual a todas. Para quem perdeu algum em uma das bigornas da vida essa contagem é um todo impossível. Por ora. A ciência não avançou a ponto de a regeneração ser uma verdade absoluta. Enquanto isso tê-los todos os torna imperceptíveis. Não se nota. E a mão fechada para dar ênfase à raiva em busca de tudo assume diferentes conotações. Quatro dedos ou menos. E mesmo os cinco mudam de intensidade, de tamanho, de direção, em suma, de convergência. Os adeptos do nada os perderiam todos se o tudo coubesse afinal apenas em uma das mãos. Olhar na face do mal e sair vitorioso. Vencendo a maldade com maldade, mas não absorvendo o mal no âmago. Se adequando às circunstâncias. A chaga momentânea sarará. E tudo terá valido a pena. Passos para frente e para trás não significam rumos. Podem ser apenas dança. Mexer os pés conforme o ritmo. A emoção é necessária para sentir o clima. Quem comanda é o cérebro, a mente. As sensações são falhas, podem mentir. E que cada mentira dita mil vezes não assuma vida própria. Às vezes não se toca o que se toca, não se vê o que se vê. O corpo ferido pelos embates sempre carregará marcas. Para sempre. E talvez achar que uma pedrada foi pancada de lajota pode pela força do pensar deixar a marca na pele maior do que é. A ferida pode mostrar carne. Poder pensar sobre o nada já cristaliza que não se está mais no nada. Um estágio. Intermediário até a chegada ao tudo. Assumindo o fim como o nada, tudo é esse momento. Difícil. A justa medida.

sábado, 29 de novembro de 2014

De antemão

Ele previa o imponderável. Era um dom? Era um dono do próprio nariz! Colocava as fuças onde bem quisesse. Mas nem sempre queria. Sabia. De antemão. Que fumaça de carvoeiro deixava as narinas sujas. Queria 24 horas de limpeza? Nem Bauer. Nem Bayer criara remédio tão mágico quanto isso. As crostas protegiam. A inversão do êxodo rural ocasionaria a morte de todos os seus descendentes. O ar rarefeito do amontoado de gentes mínimas de esperanças que habitam os conglomerados de cimento e fumaça já era parte do código genético. Agora além do daqui pra China seria daqui pra outras galáxias. Outras ordens sintáticas. Novas táticas de sobrevivência. Antevia. Estar limpo para o sempre? Não. O sempre sempre acabava. Pulava fora de prognósticos malfadados ao insucesso como o marinheiro que vê o bote encharcar de água. Saber nadar não seria uma opção nesse momento. Agora: quando tinha o que não queria aceitava quando era preciso. Uma necessidade zombeteira dos acasos do destino. Uma resignação por falta de opção de ação. Uma fração. Um lapso que só aconteceu devido àquela determinada curva; àquele minuto a mais ou a menos. Sinapses peixe-piranha que comem todo e qualquer mastigar ruminante de pasto das possibilidades. Imagem de inverdade? Não duvide se algo além do compreensível bater na porta do dia comum. É o modo de enxergar que faz do susto o salto para o sul ou o norte de uma ideia. Viagem! Pingue-pongue. Leva e traz tem de monte. De mote. De mover. De matar. Basta um busto de desconfiança. Besta: um animal, uma entidade. Critérios de classificação. Pontos corridos. Mata. Mata. Há tempos ouvia a máxima de que “a vida era vida”. Era ampla. Dava essa abertura tremenda. Tremia. Mesmo tendo a consciência plena de que o próximo ovo seria mole. Planos pra quê? Por isso nem pedia como queria. Deixava ao critério do que viesse. Ser dono de um estabelecimento era um dom. Antever o que o cliente quer. O mundo era seu estabelecimento. Agora era usar de todas as faculdades. Prestar vestibulares. Saber. Chutar respostas. Antes de tudo perguntar. Usava seu olfato apurado. Algo não cheirava bem. Mas isso já estava escrito. Nas primeiras linhas...

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Untitled

Fim de ano é isso: Vários se reúnem como se estivessem em um imenso jogo de cartas de que todos devem participar; cada um tira a sua, olha o naipe e esconde; depois de um tempo tudo será revelado. O resultado deve ser satisfatório para todos. Ou estipula-se um preço por essa jogatina, ou pede-se o que se quer como paga. “Secret Broda”. Surpresa!

“A pessoa que eu tirei é assim, assim e assado...”. Não literalmente, se não apostariam naqueles (as) que andam com as pernas muito abertas. Problemas nos fundilhos. Mesmo sem fundos têm que angariar a grana para poder estar em meio às celebrações. E o amigo oculto se revela. Talvez o pior inimigo.

Intimidades com quem não se gosta. Inimigo íntimo. O pior. Mas segundo aquela máxima “os amigos perto, os inimigos mais ainda!”. Livros de auto-ajuda para aqueles que se julgam seus piores inimigos.

E no verão chocolates vão derreter nos 'amigo-chocolate'.

Certa vez participei de um desses. Dei uma barra do doce de cacau marrom e ganhei um aparelho de barbear. Na época ainda era imberbe, cara limpa. Não achei ruim. Só acho que o fato só ajudou a me desprender mais do açúcar.

No Brasil a celebração do Dia do Amigo é 20 de julho. Parceiras são desfeitas, feitas e refeitas a cada dia.

20 de novembro. Dia da Consciência Negra. Comumente vejo que “os próprio preto não tá nem ai pra isso não”. O preconceito ainda está implícito. Como um inimigo íntimo que não se conhece.

Chocolate branco não é preferência nacional. Acho. Temos que resgatar a nossa descendência para uma sociedade mais igualitária. Assim ascender. Tenho certeza.

Em 2008, Nas não pôde lançar um álbum com o título N.I.G.G.E.R. Foi rotulado como fortemente racial. Virou Untitled (Sem título). Se um negro fala algo do tipo para outro negro assume diferente conotação. Como no recente caso do Sul, além daquela branca que ficou como porta-estandarte da representação racista, havia negros participando dos xingamentos. Ai pode?

Questões complexas que para serem aprofundadas é necessária ‘uma cota’ - na gíria que significa muito tempo. As cotas, por sua vez, vêm trazer um paliativo para o descaso histórico com a população negra. Muito tempo. 


Fim de texto é isso. Até o próximo, ‘my nigga’, ou ‘my broda’.

domingo, 19 de outubro de 2014

Pernilongos

Os pernilongos voam. Fazem sofrer. Sofreram uma mutação genética ao longo dos tempos. Tiveram que se adaptar. Os pernilongos zumbem, e o zumbido que eles emitem ficou mais alto em graus de decibéis. Pudera. Com a expansão dos eletro-eletrônicos é barulho pra burro na sociedade das cargas. Os cachorros têm uma audição mais apurada. Sofrem com os sons de bombas. Sofrem com aqueles carros nas ruas que tocam os batidões em último volume. Os animais sofrem. O ser humano antes de tudo é um animal. Tanto nas funções mais primárias da vida, quanto em momentos como esses, quando soltam bombas e rojões a esmo, incomodando os melhores amigos dos homens e seus donos; quando equipam seus fuscas velhos com aparelhos novos para fazer o chão tremer quando seus carros passarem. As orelhas devem ser a parte do corpo que tem o sangue mais saboroso. É impressionante como o senso de direção dos pernilongos os leva diretamente para elas. As orelhas. Elas que ouvem o excesso de barulho do mundo têm mais uma carga: aturar o vôo rasante dos insetos que gostam do vermelho da carne mal passada dos bípedes. E são rápidos. E são muitos. E são grandes. De onde surgem tantos é uma incógnita. Ou talvez não seja. Mas é uma informação que precisa ser buscada por quem a acha necessária. Nos dias quentes, ventiladores e outros aparatos de refrigeração são elevados a um nível de importância master. Fazem ruídos. Burburinho de cochicho ou gritaria de feira livre. Livrai-nos do mal. Há o regozijo de meter a mão e matar um vendo o próprio sangue que se esvai em outro ser. É a conjunção cósmica. O universo que conspira ou a conspiração do universo? Paradoxo. E os pensamentos partilhados estão como que armazenadas na nuvem, no drive virtual, um lugar onde nem todos podem ter acesso e grande parte desconhece que existe. Muitos decibéis. Como uma nuvem de pernilongos que se juntam e impedem o caminho em final de tarde. A meta é passar por eles – pernilongos e pensamentos -, buscando o menos sofrer, almejando o mais voar. Com autonomia de quem não depende de milhas. Com uma melodia alegre na cabeça e no ouvido. Passando pelas mutações necessárias. Se adaptando. 

sábado, 20 de setembro de 2014

Quem nasce em setembro

Quem nasce em setembro tem um pouco do desabrochar da primavera. Como uma estação que acaba e outra que começa, tem um quê de re-começo; querer de mudança; síndrome do “mais”. Não que quem nasça em outros meses não possa ter essas mesmas características, é só uma soma aritmética do momento da concepção até o vir ao mundo efetivo.

   A pessoa que nasce nesse mês foi feita em dezembro, no máximo no começo de janeiro. Disso pode-se supor que o desejo veio do desejo de comemorar o ano bom fechando um ciclo e começando outro, ou a ideia era dar um start em novos planos, e nenhum plano é mais mirabolante do que conceber uma nova vida. Em tese. Na prática – que é executada ao bel prazer -, um filho pode vir sem planejamento algum, mas hoje em dia na maior parte dos casos não se pode usar como desculpa a desinformação, nem a falta de televisão.

   Foi um passo adiante para o casal: colocar alguém mais naquela relação a dois, alguém que dependeria dos dois por muito tempo, alguém que teria aspectos vindos da somatória dos dois códigos genéticos que por suas vezes eram conjuntos anteriores misturados. Sagas. Famílias.

  Talvez por tudo isso, fazer aniversário nesse mês seja como um ano novo pessoal antes do ano novo derradeiro; seja a hora de fechar a casa e fazer a limpeza do que aconteceu deixando a folha em branco para novos rabiscos. A caneta: a vida é como aquela borracha com uma ponta vermelha e a outra azul que se dizia apagar tinta de esferográficas. Nunca apagou. Nunca apagará.

   E de setembro a setembro, de primavera a primavera, vão sendo feitas as contas das primaveras dos que nascem em setembro. O somar de redundâncias ou do domínio da linguagem.


   Mais um mês, apenas. Tudo depende do olhar. De como se vê. Re-começos, mudanças, mais.

sábado, 23 de agosto de 2014

A vida é um salto

Pulou, foi sua última jogada, cartada, empreitada. Daquela altura, o mestre-de-obras da empreiteira quando construía aquele andar do prédio olhou para baixo e sentiu um frio na barriga. Muitos anos antes dele pular. Era um pressentimento.

   Quatorze andares. Catorze. As duas formas são corretas. O corretor automático do Word não denúncia erro. Difícil seria pro corretor de imóveis vender ou alugar aquele apê depois de ele saltar, qual o quê. E se esfacelar na rua. Como carne amassada de hambúrguer. Feito de minhoca, rins, pâncreas, bílis, misturas de carnes. Foi de encontro à luz. Sua alma - se sobreviveu - olhou a sua matéria estatelada e sentiu enjôo dos fast-foods. Não tinha o que jogar pra fora. Nem pra dentro. Não se tinha. Ficaria vagando naqueles cômodos onde curtiu até o máximo a sua depressão. Repetiria o salto um sem-número de vezes. Esse seria seu carma até aceitar que deveria ir pra outro mundo. Ou o seu perfeccionismo não desistiria em busca do salto perfeito, aquele onde não há vestígios de que passou por esse mundo.

   Atingiu o peso de muitas toneladas. Se alguém passasse por baixo àquela hora seria esmagado por uma força descomunal. Seria muito azar. O mestre-de-obras passeando com seu filho pela cidade mostraria orgulhoso os prédios dos quais participou da construção; diria que o filho devia se orgulhar pois o pai participou da construção daquela cidade grande, imensa, mas ao mesmo tempo com ares de pequena. Contaria no exato momento da queda que sentiu um calafrio quando estava naquele andar, muitos anos antes do outro pular. Lacunas de espaço-tempo. Buracos de minhoca. Apontaria com o dedo e veria um corpo caindo com uma velocidade de carro de Fórmula 1. Seria muito azar. E ele, o pai, dizia pro filho que não era bom pronunciar essa palavra, para evitar maus agouros. Isso não aconteceu. De os destinos se cruzarem na esquina da vida. Sinal vermelho. E a relatividade da duração das horas se mostrou voraz quando aqueles quatorze – ou catorze – andares pareciam uma eternidade, tempo onde passou pela vista do suicida toda uma vida, ou todas as mudanças que a vida sofreu em suas diversas fases, o que dá a impressão de muitas vidas vividas em uma só. Mesmo na morte o que mais se vê é vida. No meio do caminho desejou voltar atrás. Mas não inventaram máquina do tempo. Pelo menos não até a época da sua morte. Talvez mais pra frente, humanos até conseguissem voar devido aos avanços da ciência e as mutações genéticas que antes só existiam na ficção fariam parte da realidade.

   Pra ele já era isso. Misturava o imaginado e o real constantemente. Pendia mais para as viagens. Não obstante nunca saiu do seu país. Foi no máximo até cidades próximas que faziam parte da macro-região em que morava. Depois do pulo foi além, pro além, rumo ao desconhecido, ao infinito ou a finitude. Não supunha. Foi tirar a prova dos nove. Se fosse um gato de sete vidas como no clipe da banda Gram teria a possibilidade de tentar de novo e de novo e de novo. Mas como aquele, faria o salto derradeiro quando as suas vidas se esgotassem, talvez pelo mesmo motivo. Será que foi isso que aconteceu? Fica a pergunta sem resposta. Pergunta que gera pergunta que gera pergunta. Poderia ter um milhão de vidas que repetiria os mesmos erros.

    Do avião, os passageiros olham pra baixo e veem a pequenez dos seres humanos lá. Formigas. Pensam na pequenez deles mesmos, mesmo sendo pessoas importantes, constantemente à frente dos holofotes, reconhecidas por outras. Elefantes. Tudo prossegue normal até aquele momento. Num "ops!" a chuva aperta. Um deles olha o aplicativo de clima no celular e avança para os próximos dias, alterando as cidades várias vezes, tal qual será o itinerário dos compromissos. As estatísticas garantem que o avião é o meio mais seguro de transporte de passageiros. Estão tranquilos. Mais o tempo fecha. O piloto alerta que se segurem firme porque o pouso vai ser forçado. A nave poderia sofrer avarias, mas dentro em breve estaria tudo sob controle... Alguns minutos depois o fogo consome um terreno baldio e várias casas ao redor. Uma bola de chamas. E todas as máquinas que estavam a bordo sofreram avarias irreparáveis. O corpo humano é uma máquina frágil. É um, dois. Grãos de areia a menos no monte. Toda vida faz parte da humanidade.

   Acorda. Olha a corda. Está enforcado em pensamento ruins. Pensa em se enforcar. A cadeira está à postos, a corda idem. Não há mais o que fazer. Olha o avião que passa ao longe e pensa que poderia viajar antes de cometer tal ato. Não tem empolgação, não tem vontade, não tem mais nada. Sua vida é um não. Não agradece por ter acordado vivo, por ter visto o dia nascer. Tudo está escuro. Seu quarto é treva. Rodeado de bajuladores que não querem saber da sua verdade. Vendeu sua cobertura do décimo quarto andar. Agora seria uma boa. Mal. No chão, ou se remedia até não querer mais para mascarar o que não tem remédio ou mete uma bala nas fuças ou a terceira opção, aquela que está a sua frente, que é a única que realmente cogitou de verdade. Os que o conhecem verdadeiramente sabem que ele só poderia fazer isso desse jeito. Os que se preocupavam sabiam que estava prestes. Ajudavam com conselhos e abraços. Não bastou.

   Dinheiro não faltava. Fama tinha. Família também. O que era aquele vazio? O vazio da existência? De não ter certeza? O mundo acabaria um dia. Não esperaria. O mundo para ele acabaria quando o seu mundo acabasse.

   Levantou reticente, soluçando em seus passos. Subiu na cadeira como um gato que sobe em uma penteadeira alta, com vagar e calma impossíveis de serem reproduzidos no mais fidedigno slow-motion. Olhou a janela. Embrulhou o pescoço com um cachecol de mortalha. Empurrou a cadeira.

   A vida é um salto.  

sábado, 16 de agosto de 2014

5

Co-piloto.
Antigamente se sentava em cima do motor, suava os fundilhos, ao lado do motô. Prestava atenção no movimento da mão direita na marcha, dos pés nos pedais. Via que não havia câmbio para canhotos.
Pensou em ser motorista.
Ouviu dizer que esses profissionais eram propensos a ter doenças no saco escrotal por causa da exposição constante ao calor excessivo.
Desistiu.
Hoje há corrimões onde antes se acomodava. Então ele fica ali, em pé, ao lado, na porta dianteira, tipo mostrando o caminho, fiscalizando, ou sabe-se lá o quê.
Escroto. No fundo não quer pagar a passagem, e se quando criança existia uma admiração inocente sem outros poréns, agora crescido o que se vê é uma amizade forjada no interesse.
“Esse é meu ponto! Tá lotado pra passar pra trás, né?”.
“Desce pela frente mesmo”.
“Brigado e bom serviço!”.
O busão agora está desprotegido.

sábado, 26 de julho de 2014

Calos nas palmas

   Adquiriu com o tempo um costume diferente. Abria as tampas de garrafas com o dedão e a parte da palma da mão que fica logo após o mindinho. Isso ocasionou um calo. Não sabe ao certo quando começou. A pele da palma, muito fina, sendo forçada dessa forma foi ficando mais dura que o restante. A casca do calo quando passava por extensa exposição à água ficava mole. Isso ocorria após a lavagem de roupas ou de louças, ou depois de um longo tempo no mar ou na piscina. Quando chegava em casa, a pele daquele lugar estava diferente, branca, muito mais branca que a pele branca da palma da mão. Era como uma bolha estourada. Seu prazer era retirar aquela pele - como se fosse uma parte morta do corpo -, e jogá-la ao léu. Ia com o vento. Caia num bueiro. Assemelhava-se ao ato de jogar cinzas de pessoas ao mar. Mas não era. Ou era quase. A pele arrancada ficava cinza, e caia no esgoto para ficar preta, marrom, aquela cor de excrementos (se é que há uma cor predominante). O local do buraco ficava rosado. Daí em diante era o tempo da regeneração da pele, que podia variar. Algo que ele não dominava. Que acontecia sem a sua interferência, o mesmo que aconteceria com aquela sua parte do corpo que fora desfeita e jogada a esmo. Aquilo que não era mais seu era do mundo, da terra, ou da Terra como um todo. Começara a devolver tudo que usufruiu do planeta antes mesmo da morte. Era um pagamento parcelado. E se perguntava: “a pele morta viveria de alguma outra forma?”, e “os mortos reviveriam de certa forma com o usufruto que a terra daria aos seus restos?”.
   Com o dedão da mão esquerda coçava o buraco deixado pelo calo que se foi da mão direita. Tinha duas mãos. E quem não, como faria? Cada caso é um. Tinha duas. Por isso podia fazer o que fazia e qualquer outra coisa.
   Lavava. Não como Pilatos. Era mais um ato de expurgar sujeira. Será que não estaria mais protegido com a formação de anticorpos ou uma carga de poeira? Olhava as estrelas. A vida era sonho.
   E a promoção das tampas de garrafa concedia prêmios. Bastava abri-las, beber o conteúdo ou poluir o solo jogando nele aquele líquido cheio de gás. A repetição aperfeiçoa e cria calos. É isso.
   Cláp! Cláp! Cláp! Alguém bate na porta da frente. Mão na maçaneta para abrir. O que vier é lucro. Ou pode ser alguma cobrança. Para. Engole um soluço, se cala. E com o dedão coça o calo.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Notas sobre a Copa

Disseram que foi a vitória da organização sobre a malandragem. Pelo contrário: o malandro virou mané e não conseguiu frear o pé dos ‘Lemão’. Valha-nos: o ‘bom’ malandro ia dar um jeito de modificar a situação.

Culpa da globalização? Talvez. Falta de identificação com a pátria dos que choraram aos glups durante a execução do hino? Sim e não. Não é recriminável. Mas crocodilos morreram na praia. 
Como dizem: “depois que a onça tá morta todo mundo é caçador”. Fomos presa fácil.

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O Brasil foi outro depois do começo da Copa do Mundo. Senão vejamos: onde antes, às tardes, havia uma porção de programas medonhos, enfadonhos, ‘nhonhos’, surgiram jogos de encher as vistas.

Até os americanos e sua bola de ovo entraram no embalo. Até brasileiros que antes não ligavam muito se alertaram. Afinal, a Copa é no Brasil!

Com os feriados, e o horário reduzido no trabalho, a torcida se intensificou: quem não torcia por um motivo torcia por outro.

O time que representava o país sede tinha um personagem que personifica o craque, o herói, aquele que pode resolver tudo em um lance, feito passe de mágica, em um passe de mágica. Um bruto quebrou aquela varinha de condão e os outros ‘mortais’ jogadores se viram inertes. O verde, os amarelos, os marrons, ficaram brancos.

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Torci, e por que não? Acreditei. Falhei em minhas previsões. Como agora. Depois da raça demonstrada pela Argentina na semifinal, torço pra que consigam, mas analisando friamente, a Alemanha é sete vezes mais time. Levo-me pelo emocional. Como no resultado da disputa do terceiro lugar: que dê Holanda. Uma birra pelo vexame.

Laranjada da boa. Caipirinha leva limão. De repente o caldo pode azedar. É crítico. É cítrico. Que vença o melhor. E que o derrotado “chupe essa manga”.

domingo, 8 de junho de 2014

Chovem gotas pretas gorduchas

O abandono do negrito não foi premeditado ou pensado. Apenas aconteceu.  Ele merece uma menção honrosa por todo o seu serviço prestado. Com a sua visibilidade maior, ajudava a enxergar melhor os (as) de visão menos acurada. Ler. Para crer ou não dar nem crédito ao que estivesse escrito.
                              
Pode significar um emagrecimento. Mensagem slim. Sim. Não. Quem sabe. Vai ver ele já vinha dando toques sobre o seu cansaço. Siga seu caminho. Deixou sua marca.

Clean, um tchan. Questão de preferência, de momento, de fase.

Próxima!

Não o abandono pelas ruas. Nem o gastei em tintas de papel.  Levo-o no coração. Sua herança fica na nuvem, meu amigo que traz toda uma significância histórica pela sua cor, negra. “Negrito!”. 

Chovem gotas pretas gorduchas...

Não tá fácil pra ninguém

É triste gente que bufa. Quem nunca topou com um desses por ai? Rapidamente são notados. Talvez seja essa a intenção.

Normalmente é fácil vê-los – e principalmente ouvi-los – em dias de avaliações.

É isso. Adquirem um método de fazer provas desde imberbes. Se sabem a resposta bufam, se não sabem, idem. Um jeito de pensar com grunhidos. Um ato que exige a musculatura do corpo todo e não apenas a boca, como quando a língua dá aquele estalido de reprovação: “Tsc”. Ficaria pior.

E se por acaso em teste, de um lado estiver alguém bufando e do outro um chupando cana, daquele jeito, com o nariz, aquele caldo que chega a sujar o bigode ou o buço e depois retorna para onde saiu: “Argh!”. Sem nojo ou desespero!

Deve ser tática de atrapalhar adversários, oponentes. E como tira a concentração!

Aberração. Ser humano. Propenso aos cacoetes da espécie.

Mas pera lá. Manera.

No entanto todos os barcos são semelhantes, têm cascos, e por um ‘isso’ se quebram vidraças e se multiplicam cacos. Não julgueis.   


Cê acha... Aguenta ai, sossega o facho. Não tá fácil pra ninguém.

sábado, 31 de maio de 2014

O mendigo do fone de ouvido sem fio

Quem já viu o mendigo do fone de ouvido sem fio?

Tava frio.

Vai ver era pra proteger a orelha. Eu já vi mendigo com cobertor de orelha.

É a centelha. Paixão que surge parelha.

O título do álbum do Criolo é 'Nó na Orelha'. A maioria dos mendigos são criolos.

Talvez esse seja um tipo high tech, que fuma um béque e depois masca chiclete.

Ainda por cima (ou por baixo), utiliza 'wi-fis' que não precisam de senha.

Pra viver não é preciso senha. Ao passo, ninguém 'vive' sem ter uma conta no Banco, que exige senhas, e documentos em ordem.

O mendigo não tem conta, nem senha, tão pouco documentos. Vive ao relento, dormindo na fachada do Banco.

Descolou um cobertor branco que com o tempo ficará preto. Um negro passa acelerando o seu carro de luxo último modelo.

Ele aumenta o som dos fones azuis. Ou apenas fecha os olhos e os ouvidos para dar um tempo da sanha da vida. 

sábado, 10 de maio de 2014

De todo modo, sou bacharel em jornalismo

Hoje fui buscar o meu diploma de jornalista. “Mas jornalista precisa de diploma?”. Isso não vem ao caso. A questão é complexa e depois de aprovada a PEC do diploma ainda é aguardada formação de Comissão Especial, e só depois o Plenário da Câmara irá decidir em uma votação de dois turnos. Mas existem muitas coisas técnicas e éticas próprias da profissão que só são aprendidas na graduação.

Um bom jornalista não pode ser inocente e não saber nada. Também não pode ser um expert em determinado assunto, se não, pra que entrevistas? Deve saber um pouco de tudo e um tudo de nada. Um ‘tiquinho’ de cada coisa. É claro que existem as especializações. Isso não livra o jornalista de ser antes de tudo um generalista, antes de especialista, ou um dos dois, ou ambos ao mesmo tempo.

Foi uma peleja árdua. Transitei entre diversos corredores e salas diferentes durante os quatro anos de curso em meio a professores que já haviam exercido a profissão – e por isso tinham propriedade pra falar do assunto, além de suas formações acadêmicas de mestres e doutores -, e alunos que desde o primeiro ano já trabalhavam na área. Não lembro quantos. Lembro que o coordenador disse logo de cara que daquela classe inicial de cinqüenta, sessenta alunos, uns cinco, seis iriam seguir a trajetória e se encaixar no mercado pós-curso.

Ao longo dos anos muitos foram ficando pelo caminho. Descobriram outra vocação e ingressaram em outros cursos, ou por motivos diversos tiveram que parar, não quiseram continuar. Como uma garota que dizia aos quatro ventos que não gostava de ler. Ficou no primeiro semestre.

Dos aproximadamente trinta que persistiram até o final, não tenho certeza de quantos estão atuando. Provavelmente aqueles (as) que já atuavam continuam. Aqueles (as) que tinham dúvidas firmaram suas certezas.

No meu caso ainda falta o MTB (registro de trabalho peculiar aos jornalistas); falta um começo, um primeiro passo no mercado de trabalho, que é concorrido e cheio de nuances próprias. Não falta vontade. Esse é um requisito básico pra tudo que se for fazer.

As grandes empresas são fechadas e têm a sua filosofia própria. Entrar em uma requer a concatenação com a visão de mercado e de mundo que seja a vigente para cada qual. A internet abre leques de possibilidades para novas alçadas no campo comunicacional.

Falo pouco. Às vezes escrevo além do que é necessário. A linguagem jornalística me ajudou a ser mais conciso na escrita. De todo modo, sou bacharel em jornalismo.

Bora trabalhar o texto. 


P.s: Esse texto foi escrito em 24 de abril. Foi quando peguei o meu diploma. Fiquei na dúvida entre postar ou não. Um tempo depois, ouvindo duas estudantes de Psicologia comentarem sobre o futuro da profissão, e de como o mercado de trabalho era concorrido justamente por existirem muitos profissionais se formando, consequentemente existindo uma remuneração baixa, a frase que uma disse pra outra me clareou uma verdade: “É, como diz a minha mãe, essa é uma faculdade para vida e não para ganhar a vida”. E se no fim, ‘nothing’ surgir na área, fica esse consolo, ou esse conhecimento eterno enquanto se vive. Uma maneira de ver o mundo, analisando todos os lados, escutando as diversas partes envolvidas no todo.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Variáveis x nos eixos Ypisilons

Cansava-se. Tanto de andar contra a corrente e sempre ser empurrado para o outro lado, quanto de ir junto com ela e nunca chegar à bendita ou maldita cachoeira, podendo após desaguar nalgum lugar. O sol sempre nasceria, a não ser em dias cinzas, e a cada qual, claro ou escuro, um novo leque de variáveis x nos eixos Ypisilons. Mas um horizonte sempre em aberto conjumina com uma conta na venda idem. E a dona cobra. E o tempo cobra. Impossível fazer contas. Irrelevante a quantidade de ‘experts’ em matemática ao dispôr. O depois sempre advém do agora, enquanto os grandes crânios não descobrem as brechas no tempo-espaço pelos buracos negros ou de minhoca. E quando o cobrador bate à porta se esconde num buraco de tatu dentro de casa. Silêncio total. Não é má pessoa. Apenas está ‘ruim das pernas’. Bolso furado. De um tamanho que possibilita passar diversas variações de animais. “Burro!”. Urra só. Só urra. Não esboça outra reação que não seja essa. E de uma reação descobriram a partícula de Deus (Bosón de Higgs). Ele reza baixinho. Quase nem se ouve. Já fez penitências e teve pedidos atendidos. Já viu outros que não fizeram, blasfemaram e conseguiram mais. É do time do ‘menos é mais’. Não torce pra ninguém. Torce a roupa e põe no varal, lembrando o que ouviu dizer das lavadeiras que faziam o procedimento de limpeza das vestimentas nos rios, com as correntes. Uma cachoeira de ideias surge na sua mente.

terça-feira, 25 de março de 2014

Certeza?

Ele desejava sumir. Desejava estar naquele avião que sumiu. Sabia que teria a sua Ilha de Lost na pós-vida. E estava perdido. O mundo era o seu mar. Estava preso no aeroporto como Tom Hanks, e desejava ficar sozinho na ilha, como o mesmo Tom. Um tom diferente o invadia. Não tinha o ouvido puro mas sabia identificar uma música pelas seis primeiras notas que eram tocadas, como aquele clássico toque de celular de Beethoven. Já tinha se deparado demais com o caminhão de gás. Tinha se esvaído. Melhor se tivesse ido. Pensamento recorrente. Mas sempre haveria o yin-yang, o positivo e o negativo, o macho e a fêmea. Não que uma coisa estivesse relacionada com outra. Não havia uma ordem direta, a não ser a do nascer e do morrer. Não se pode inverter. Algumas religiões fazem isso, quando mesmo depois da morte se vive, ou quando a morte é um banco de reservas para jogar outra vida em outro time, com outras cores e mantos. Bantos cantaram muitos banzos nos navios. Será que tiveram outras chances? Perguntas sem respostas levam a reflexões. Gritos de torcedores dependendo do ângulo de audição podem se assemelhar aos dos sofredores. Os dois podem ser um. Igual àquele time inteiro que morreu em um voo, o sumiço de pessoas em um mesmo momento pode significar que tinham alguma relação ambivalente. Vital? Lançava-se na vida com uma única certeza.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Outro carnaval

Último dia do mês. Primeiro dia de carnaval (oficialmente).

Fiquei até esse exato momento em que começo a escrever essas linhas pensando sobre o que falar e buscando inspiração para colocar no papel (na tela) algo sobre essa festa popular (do povo?).

Busquei os meus antigos carnavais na mente. Já fui quando era na Av. Francisco Glicério – a principal via do centro de Campinas. Fui também ao sambódromo armado na saída do túnel Joá Penteado. Desses, não me lembro de nenhum acontecimento extraordinário que valha ser contado. Não fiz nenhum filho. Talvez tenha me aliviado das cervejas bebidas em alguma árvore, tendo assim contribuído para o crescimento da mesma. Quase o mesmo que plantar. Não escrevi um livro carnavalesco. Da tríade máxima do ditério que vale pra vida (plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho, o que Wandi Doratiotto colocou muito bem em música), nessa vida à parte chamada carnaval, fiz um ponto.

Fiquei pra trás. Como sempre ficava em relação à multidão de pessoas que corriam atrás dos trios elétricos. Por querer mesmo. Praticava uma contemplação de voyeur ou exercia aspectos masoquistas, por muitas vezes estar em determinado local no tempo-espaço por força das circunstâncias que uns julgam destino outros acaso. Obtinha prazer pelo prazer alheio, e ao mesmo tempo doía.

Haverá outros carnavais para chegar ao nível de ‘exaltação da vida’ dos outros. Esse ano mesmo, o lugar se difere. A festa ocorrerá na estrada dos Amarais, próxima ao famoso cemitério. Ao que parece os serviços do segundo vão ser suspensos em benefício do primeiro. Saramago se reviraria do túmulo (se não tivesse sido cremado) para dizer: “Eu avisei! São as intermitências da morte.”.

E a alegria pede passagem. Ela, essa entidade imaterial que pode sempre aumentar com a obtenção de bens materiais – já que se o dinheiro não traz felicidade, manda comprar -, suborna a tristeza nesse ínterim onde só ela deve reinar.

Reinem reis Momos e rainhas de baterias. Que os que tem o rei na barriga façam suas necessidades fisiológicas e se juntem às pessoas comuns. Quem for de extravasar, extravase. Pra quem vai ficar na toca, desligue a TV. Pelo menos os canais abertos. As ruas e almas estão abertas. 

Depois tem cinzas. Depois quaresma. Depois Copa do Mundo. Depois eleições. E logo menos, outro carnaval.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Ser e estar

Não importa o lugar. A pessoa depois de feita será sempre ela independente de onde. Se é que é possível um dia alguém sentir-se totalmente feito. Depende da perspectiva. O feito pode ser em relação à concepção, quando o espermatozoide atinge seu alvo. Pode se referir aos três meses de gestação, quando se diz que o feto se constituiu cientificamente. Depois de vindo ao mundo, o ser se torna ser quando as suas definições do que é mundo começam a tomar forma. Mesmo no achismo: “Acho que isso tem que ser feito desse ou daquele jeito...”. Ou com conhecimento de causa: “1 + 1...; vivo no país tal; compartilho a língua e a cultura ‘x’”. Mesmo no jeito de sorrir pra câmera quando vem a intimação: “Olha o passarinho!”. Todos estão filmando. Uns aos outros. Vendo quem voa ou não sai do lugar. Quem ainda tem asas ou as cortou. Cortaram. Quem chuta com o pé ou corta com a mão. Quem estende a mão ou dá de ombros. Quem em um esbarrão de ombros pede desculpas ou fuzila com a íris ou outros órgãos inerentes ao corpo, quando não com extensões dele. Ou? Como o osso que o macaco ergueu ao céu e virou nave na briga por território. 2001. Não passarás? Passou. Tudo passa. Descansem em paz, Nelsons. Ned está explícito, Mandela talvez. “De que me importa?”. É a questão. Pode ter importância. Pode não ter. Depende de como se vê o redor. Do que se conhece. Do que se sente. O conhecimento pode ser empírico também. Depois da junção gradual de corpo e mente ao longo dos anos se chega à visão. O viés dela. Copos, meio vazios e meio cheios. No meio. Na balança do ‘mais ou menos...’ pendendo ora para um lado outrora para outro. Roco de tanto falar sozinho. Tonto de tanto dar volta em volta de si. Sim, claro, menos no escuro. A ideia de noite se modificou depois da invenção da luz elétrica. E mesmo em uma era onde parece que se pode conhecer tudo de tudo, coisas obscuras dos Illuminati continuam surgindo. Teorias. Conspirações. Coisas a que os indivíduos se apegam. A coisa toda é feita de muitas coisas, pra cair na obviedade e não gastar latim. E o cachorro que cresceu com seu dono abana o rabo e não late. Late. Inglês-Português. Nunca é tarde. Sempre é hora. Agora. Os ‘agoras’ mudam, e hoje em dia são compartilhados simultaneamente por check-ins de Fousquare. O que importa é antes saber o que se diz pra si mesmo pra depois comunicar-se além. A vida ‘é vida’. Viver de restos não varia muito da América do Sul para a do Norte. Raulzito que esteve nessa empreitada disse que a diferença é que lá tem muito Ketchup. Aqui prevalecem tomates podres. Ou verdes, fritando. Depois de ‘pronta’ a pessoa pode ir daqui pra China, do Oiapoque ao Chuí, para Marte, parodiando ou não Shakira (pois o amor pode ser uma viajem no universo ou o apego a um simples gesto), e será sempre ela, a pessoa, do jeito que se constituiu. Pode mudar? Pode! Se a bomba está para estourar, sem demora. Achando seu lugar no seu mundo, concomitante ao mundo dos outros, nesse mundo, em todos os mundos possíveis e imagináveis.