terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Fim do mundo é água engarrafada ou fim de ano e brindes sem copos d'água





























Água vetor criado por angbay - br.freepik.com 

QUANDO COMEÇARAM A ENGARRAFAR ÁGUA PRA VENDER FOI O COMEÇO DO FIM DO MUNDO.  Nos engarrafamentos, em meio, no meio, seres ao meio, entre o lugar de partida e o lugar de chegada, tomando água quente na garrafa já passada, cheia de micro-organismos que se formaram ao longo dos dias. Dar água para égua beber na parada no saloon devia ser tarefa mais fácil nos tempos antigos, entre um “bang-bang” e um escalpelar de índios, estilo Yankee pele branca, vermelha, com bolhas de sal, suor e sol, sem vergonha na cara ao dizimar um povo proprietário porque pisou primeiro. Na brincadeira de criança desvirtuada cortava-se a mão de quem estava com o brinquedo, e que até já pensava em repartir. Quem quer tudo pra si espuma a boca seca com mísera saliva. Vísceras. 

Ouvindo o noticiário no rádio, no fim do dia, na fila de máquinas paradas que andam pouco-quase-nada, o desejo é uma terra pacata, com mínimos transeuntes, disputando as ruas apenas com moscas e mosquitos. Fontes cristalinas que jorram a mais pura transparência do que o líquido vital (e a vida) almeja. Ali, na picardia do horário de pico, mesmo os mais bem aventurados de conta bancária — os donos de carros caros —, são submetidos a contragosto a um comunismo de arrebol, mas isso não impede que os outros meros mortais (com veículos populares ou quase carroças que não pagam IPVA) os identifiquem como estando do lado do muro onde o capital escorre farto, e não na outra parte onde o pouco é repartido a conta-gotas e infinitas prestações; não obstante, a felicidade material não é tudo, e um ‘poisé’ velho pode conter dentro um casal feliz e terno ou mesmo uma família unida e rica de espírito. Romantismo, Realismo ou Pós-Modernismo? Ao bel-prazer, léu do ser, aos ‘léis’. 

Impossível dar Ré. Passível ter Dó. Tudo isso Lá. Tocar todas as notas de uma só vez extingue a beleza que existe no minimalismo, como também não forma um acorde. Estouro de bexigas oriundas de aniversário, buzinas, barulho de carburadores, motos que estouram, bombas, fogos de festa do fim do ano, ou para a virada, nada disso é música para ouvidos, sem “parabéns pra vocês, humanos”; e fecha o vidro porque o perfume não é de rosas, e o preto do pulmão que era raso só com tabaco vai transbordando junto à poluição, concomitante com o transbordamento dos rios em enchentes. Quase como brisa por osmose. Neurose. Loucura! Nunca vi um filme de fimose. "Sorry, Not Sorry".




Já o enredo de cirrose é clássico: muita pinga na veia pra entupir a mente com momentos anestesiantes, ou delirantes, ou esbravejantes. Brava gente! Mães de família heroínas! Bêbados covardes e vilões. “Às vezes a vida tem um lado, às vezes a vida tem dois lados, e pode até ter três ou quatro...”. 




Mais de 2 x 60 minutos e ¼ de hora pra chegar onde se quer. Uma trajetória inteira de coração que bate pra chegar onde se quer. Bem-mi-queres que pousam onde querem. Mal-quereres que parecem ser pré-destinados. E dá-lhe casa para quem casa e quartos de solteiros em pensões para quem não. É tudo questão de “sim ou não”. Acontece que acontecendo coisas ou não sempre vão existir o “talvez” e o “mas”. E é nesse instante, nessa fração, nesse milímetro que uma moto passa raspando de leve nos retrovisores que se mantendo ainda fixos farão com que seus donos olhem para trás com ar de alívio, pois ainda podem enxergar o passado. Já o aparato de duas rodas que necessita equilíbrio e foi feito para cair, mais hora ou menos hora cumprirá sua missão. A função da “Roda-viva” é rodar. 


De repente o que é trafego lento flui, e todos se misturam em uma amálgama de tudo em direção ao fim do mundo, que pode ser só os cafundós do brejo onde alguém mora, ou uma ideia fixa de quem se martiriza e se crucifica. E do jeito que vai, cada vez ouve-se mais gritos ecoando em igrejas cheias, mais ou menos ou vazias: “Volta logo, Jesus!”. E todo dia 25 de dezembro ele volta, de uma forma ou de outra, e, logo após, se vai e leva o ano consigo. Então, antes do fim do mundo, ainda haverá um fim de ano, onde águas engarrafadas serão os líquidos menos bebidos, mas é bom lembrar que a hidratação é necessária, pois as festas passam logo e o novo chega exigindo preparação para fins, começos, recomeços, enfim. Um brinde! E fim.

"... fecho encerro reverbero aqui me fino aqui me zero não canto não conto não quero..." (Haroldo de Campos in Galáxias)

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