sexta-feira, 31 de março de 2017

70 e 5 Nolls

Imagem: Projetado pelo Freepik

Pergunta: quanto tempo vive uma tartaruga? Resposta: Dependendo da espécie, mais de 100 anos. E um Jabuti? Já houve registro de Jabutis que viveram até 150 anos.

Os dois são parentes na escala evolutiva. A primeira pode viver em água doce ou salgada, já o segundo não gosta do molhado, então vive só em terra firme. Ambos pertencem à ordem dos quelônios, como também o outro parente próximo, o cágado. Um pouco de biologia.

E o ser humano, o topo da cadeia, qual seria a idade ideal para a morte?

É certo que a expectativa de vida tem aumentado com o passar dos anos, apesar de todos os pesares. Mas, em quanto tempo cada um consegue realizar tudo o que deseja na vida, colocar em prática todos os planos, "tornar-te quem tu és"?

Na semana passada filosofávamos sobre isso no boteco. Essa semana, com a morte do escritor João Gilberto Noll, no dia 29, aos 70 anos, a pauta retornou. "E o que tem a ver o cu com as carça?", indaga o mais expressivo dos leitores.

Explico. Noll, em seus 70 anos vividos, ganhou 5 Prêmios Jabutis  — uma das maiores honrarias literárias para quem escreve, com o adendo do montante em dinheiro que vem junto. Ou seja, no papel de escritor, cumpriu com o seu dever, alcançou o cume do monte, o auge da carapuça que serviu ao trabalho moroso de juntar letras e frases. Ornou seu casco.

Eu, na conversa sobre o tema na mesa de botequim, afirmei que para mim 70 era um bom prazo para conseguir o que se almeja e que depois só viria declínio. Bem. Estou praticamente na metade desse prazo. 

No caso, espero ser salvo pelo acaso? Não. Tento ter ações que me levem a cumprir meu destino, realista como um octogenário, sonhador como um menino, me vendo por vezes cara a cara com o fim, me surpreendendo achando-me em outros momentos quase eterno. Tipo um 'tiozão' que saindo todo dia para a luta diária da rua chora como se fosse o primeiro dia na escola. E é.

O criativo pega as frutas das ideias no ar, nos non-senses, ouve claramente o que para outros só são noises (ruídos), é tachado como nóia. Sou mais Noll.

Conheci o escritor gaúcho por um conto do livro 'Essa história está diferente: Dez contos para canções de Chico Buarque', no qual vários autores fazem releituras de músicas de Chico em contos. A linguagem me cativou, a propriedade em lidar com as palavras. Depois, adquiri 'Bandoleiros' e li com voracidade. Foi a confirmação da primeira impressão. 'Harmada' é o próximo da lista. Não sou um expert em J.G. Noll, mas do que li basta no contexto em que venho homenageá-lo aqui pela justa medida entre o viver e o fazer.

Por falar nisso, ou nele, o outro mestre das letras completou 70 em 2014. Tá mais vivo do que nunca,  novo álbum no forno, outro livro depois... Eternizado e continua a produzir. De Hollanda, Um Artista Brasileiro. Um mito vivo. Igual era Noll.

Ficam os exemplos. A comparação com os mais fortes pode levar à paralisação ou a movimento para chegar ao nível. Sem pressa, com foco.

RIP Noll. "É nóis", Noll.

Que hajam sóis para iluminar outros compositores, escritores, tendo já alcançado seus brilhos quando senhores. E que balas perdidas não matem nem Jabutis.




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